A qualidade social do transporte público na Cidade do Recife

Silvio Profirio da SilvaAluno do Curso de Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE.

Créditos: Guto de Castro/Acervo

A temática da qualidade social do transporte público nas grandes cidades não é recente no Brasil. Pelo contrário, há muito tempo esse tema é objeto de estudo de uma ampla literatura. Contudo, a maior parte dessas produções textuais que abordam esse problema se restringem ao ato de abranger questões relativas à quantidade de ônibus ou então à questão da péssima estrutura física desses veículos. Nessa ótica, uma pequena quantidades dessas matérias atentam para a questão das condições de acesso, isto é, a entrada e a saída desses transportes, sobretudo, no que diz respeito às pessoas idosas, pessoas com dificuldade de locomoção, deficientes físicos e, até mesmo, pessoas que são portadoras de problemas nos ossos, tais como, reumatismo, artrose etc. Para todas essas pessoas, as condições de acesso aos coletivos recifenses é algo penoso, em decorrências de escadas bastante altas.


De fato, não é muito comum ver matérias que têm como objeto de interesse esse tema. Mas, é bastante comum ver pessoas que sofrem em virtude desse problema nas práticas cotidianas do dia a dia. Nunca tinha atentado para essa questão. Até que, recentemente, presenciei uma cena revoltante. Em uma manhã que demonstrava ser mais uma como as demais, peguei um ônibus rumo à faculdade. Em um dado momento, uma senhora bastante idosa, aparentando ter, em média, uns 70 anos, tenta adentrar ao transporte. No entanto, ela não conseguiu, em função das escadas de acesso que são muito altas para uma pessoa com idade avançada e, até mesmo, para um jovem de 27 como eu. Por esse motivo, muitas delas não conseguem utilizar esse transporte, ou então, utilizam mas com muita dificuldade, fazendo grande esforço para utilizar as escadas que dão acesso aos coletivos.


Mas, voltando à cena que presenciei no ônibus, acreditem, ela ainda teve que ouvir um comentário do motorista do coletivo: "Ou entra logo, ou espera outro!!!!!". A resposta veio de imediato: "Eu não posso subir. Essa escada é muito alta pra mim. Se eu subir, essa noite eu não durmo com dor nos ossos!!!!". A cena foi algo revoltante não só por conta das palavras proferidas pelo motorista, como também pelas péssimas condições do transporte público da nossa cidade. Após essa cena, passei a reparar essa questão em todos ônibus que utilizo. Percebi que essa cena é algo bastante comum e que, na maior parte desses transportes coletivos, o acesso é algo penoso até mesmo para uma pessoas que não possue nenhuma limitação. Dentro dessa perspectiva, tal transporte não propicia condições efetivas para que as pessoas, em sua grande diversidade e multiplicidade, possam se locomover (acesso/ saída).


Sendo assim, as atuais condições do transporte público na Cidade do Recife evidenciam que esses veículos são planejados desconsiderando a grande diversidade das pessoas que os utilizam, o que faz com que apenas algumas pessoas possam utilizá-lo efetivamente, em detrimento de outras. Diante disso, é necessário considerar a todas as pessoas, em sua diversidade e multiplicidade, o que engloba as mais diversas idades/ condições físicas e, por conseguinte, propicia o acesso efetivo a esses bens de caráter coletivo/ público. É nesse sentido que é necessário que os empresários desse ramo e, sobretudo, as autoridades governamentais atentem para esse problema. Em outras palavras, a questão da acessibilidade ao transporte público é algo de fundamental importância que deve ser evidenciada e, sobretudo, debatida. Isso não só pelos empresários desse ramo e pelos governantes, mas pela sociedade civil que deve mobilizar-se a fim de reivindicar melhores condições nos transportes públicos das grandes cidaddes. Parece algo tão bobo e sem importância, mas não para quem vivencia tal situação. Por essa razão, escrevi esse texto a fim de tecer alguns pequenos comentários reflexivos acerca dessa problemática.

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