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sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O empresário de ônibus e a sociedade moderna

Assim como a sociedade e as formas de relacionamento mudaram, o operador de transporte coletivo tem de acompanhar a evolução.

Créditos: Ricardo Aparecido de Morais/Acervo

Até hoje quando se fala em empresário de ônibus, a reação da sociedade nem sempre é positiva.
Logo a população associa a imagem deste empreendedor a fatos como poder econômico sobre o poder político, desvios de conduta, corrupção e outros atos ilícitos.

Essa imagem se firmou pela atuação de maus empresários e até mesmo por fatos que não possuem uma interferência direta dos donos de empresas de ônibus, como a não prioridade nas políticas públicas ao transporte coletivo que deixa muitos dos serviços de mobilidade abaixo do desejado e merecido pela população que, em geral, paga caro por um transporte que ainda deixa a desejar.

Mas generalizar todo o empresário de ônibus pela atuação de alguns grupos que agem de forma desonesta é cometer uma falha injusta. É certo que existem empresários de ônibus desonestos, como políticos desonestos, jornalistas desonestos, médicos desonestos, advogados desonestos e até padres e pastores desonestos, mesmo usando Deus em seus discursos.

Mas não se deve deixar de lado o fato de que o desenvolvimento do país se deu por diversos setores, entre eles o de transportes coletivos de passageiros, seja rodoviário, de fretamento e urbano. E aí vale uma ressalva de que muitos empresários foram desbravadores de diversas regiões. Quando o poder público não oferecia condições para o crescimento populacional urbano que se dava de maneira rápida, lá estavam os pioneiros, com suas jardineiras – ônibus rústicos feitos de madeira sobre chassi de caminhão – ajudando a ligar cidades, proporcionando o ir e vir das pessoas. Claro, estes pioneiros já visavam o lucro, mas muitos eram sem sombra de dúvidas movidos pela paixão, afinal era difícil transportar pessoas.

Muitos destes donos de ônibus abriam estradas e caminhos, que depois se tornariam avenidas e rodovias com suas próprias enxadas e para-choques de seus veículos. Muitas vezes, a infraestrutura num local só chegava depois da inauguração de uma linha de ônibus, pois era ali que se firmava a população.

O perfil de transportar era diferente, assim como a relação com o poder público e com a sociedade. Primeiro que, como as cidades cresceram sem organização, assim era boa parte dos transportes coletivos. Não havia leis, nenhum tipo de regulação e não eram raros diferentes donos de ônibus disputarem ferozmente pelos itinerários mais rentáveis.

Além disso, o dono de ônibus era na maior parte das vezes uma pessoa sem instrução acadêmica. Não havia tempo. Até os anos de 1950, quem tinha ônibus era obrigado a dirigir, cobrar, consertar os veículos, limpá-los e ainda administrar financeiramente o negócio. Era uma jornada que começava por volta das 3h30 e só terminava no finalzinho da noite.

Por conta disso, a relação com o passageiro era mais próxima. Com o passar do tempo, os donos de ônibus mais dinâmicos, com maior visão e também com mais força iam aos poucos excluindo ou encampando os serviços de concorrentes.

A posição financeira de muitos destes empresários os tornavam inegavelmente influentes.  Muitos aproveitavam disso para crescerem com trabalho, mas no caso de alguns, as relações com o poder público nem sempre foram muito transparentes.

A sociedade começou então, por movimentos sociais, por instituições mais fortes e transparentes, como o Ministério Público, a cobrar uma maior clareza em muitas destas relações. Nota-se a presença de técnicos sérios nos departamentos de transportes e de comissões populares em prol dos transportes.

Além disso, a própria dinâmica da economia e do convívio social não permitiam mais a figura do dono de ônibus que brigava fora da lei com seus concorrentes ferozmente pelas linhas, que dirigia, cobrava e administrava e tão pouco dos empreendedores que não tinham uma relação transparente com a sociedade e o poder público.

E hoje, como resultado deste processo, tem se criado um divisor de águas importante: entre o empresário que tem a consciência de se modernizar e o que ainda insiste em passar por cima de leis e sobre os interesses coletivos.

Enquanto há donos de empresas de ônibus que ainda preferem por debaixo dos panos negociar linhas e permissões, há os que preferem as licitações e contratos de concessão, que são mais rígidos, mas que acabam sendo mais vantajosos em oferecer maior segurança jurídica para todos: dono de empresas, população e poder público.

Enquanto há empresários que ainda preferem remendar seus ônibus ou maquiá-los para dar aparência de novos, há os que se esmeram para estar de acordo com as novas exigências de operação e buscam certificações de qualidade como ISO 9001, de meio ambiente, como ISO 14001, controles de emissão de poluentes de seus ônibus, entre outros aspectos.

Estes empresários se modernizam e investem por caridade? Claro que não, mas porque têm a visão de que a sociedade está mudando. Eles entendem que passageiros e donos de empresas de ônibus não precisam e nem podem ser rivais. Afinal, a empresa de ônibus precisa do passageiro, mas o passageiro também precisa de uma empresa viável que tenha condições em investir em bons serviços.

Tais empresários sabem que os que não se modernizam, cedo ou tarde serão colocados fora dos sistemas. E é isso que eles querem e precisam. Associações de empresários hoje promovem campanhas para as viações lidarem de maneira adequada com o meio ambiente, com a população, em busca do respeito à lei e para contribuírem ainda mais com o desenvolvimento econômico e social. Entre elas estão a NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Setpesp – Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo, Abrati – Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros, Fresp – Federação das Empresas de Transportes de Passageiros por Fretamento do Estado de São Paulo, entre outras. Em nossas coberturas jornalísticas do setor, vemos a preocupação destas entidades de manterem seus negócios. E o negócio de transporte só pode ser mantido se ele tiver transparência, ter sua importância reconhecida na formulação das políticas públicas e, acima de tudo, se o foco principal for o passageiro, que hoje é visto como cliente. Passageiro passa, cliente, usa todo o dia, precisa ser conquistado.

Por movimentos sociais, cobrando os representantes políticos por um transporte melhor e pela prioridade do transporte coletivo no espaço urbano, a população ajuda na maior fiscalização dos serviços e na atividade do empresário de ônibus que se moderniza. Não vandalizando os veículos e terminais, não proporcionando evasão de tarifas, o povo também colabora. Afinal, se um passageiro não paga, o outro vai pagar em dobro por ele.

Assim, apesar de cada classe ter seus interesses específicos, passageiros, poder público e donos de empresas de ônibus hoje em dia devem falar mesma língua. Transporte digno é bom para todos, dá conforto, dá boa imagem política e dá lucro de forma honesta.

Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes

Blog Ponto de Ônibus

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