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quarta-feira, 20 de março de 2013

Falta de Mobilidade também amplia desigualdade social

Camada mais pobre da população é ainda a que mais sofre com problemas de mobilidade urbana. Estudo do Ipea revela que investimentos em transportes públicos devem ser constantes.


Créditos: Blog Acerto de Contas/Acervo

Quando se fala em justiça social, logo se pensa em cidades com menos desigualdades, tanto financeiras, como de oportunidades e de condições de vida. São vários os fatores que ainda fazem o Brasil ser um país desigual: diferença na renda entre trabalhadores inclusive os da mesma profissão, preconceitos raciais, falta de oportunidades de educação acadêmica e qualificação profissional para toda a população, assistencialismo em vez de criação de condições para as pessoas gerarem sua própria renda e também, logicamente, a corrupção que literalmente usurpa recursos que seriam usados para os serviços básicos para o brasileiro.

O que muitos não discutem, e que é fundamental, é que a falta de mobilidade urbana e de investimentos em transportes públicos ajuda a ampliar o abismo ainda existente na qualidade de vida entre os que possuem mais e os que possuem menos renda.

Estudo do Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, divulgado nesta terça-feira dia 12 de março de 2013, revela que a população de menor renda é ainda a que mais sofre com os problemas de mobilidade urbana, o que indica que a maioria dos investimentos em vias e transportes continua destinada para servir uma minoria da população mais privilegiada que possui mais automóveis e condições de morar mais perto de onde trabalha.

De acordo com o estudo, ao qual este jornalista teve acesso, “Na média das áreas metropolitanas analisadas, os mais pobres gastam quase 20% a mais de tempo do que os mais ricos se deslocando para o local de trabalho. Ainda, 19% dos mais pobres fazem viagens com duração acima de uma hora (somente trajeto de ida), enquanto esta proporção entre os mais ricos é de apenas 11%. Estes resultados reforçam os achados de estudos anteriores de que, em geral, a população de mais baixa renda tende a ser mais vulnerável às desvantagens no transporte urbano”

É verdade, no entanto, que a diferença entre os ricos e pobres no trânsito têm diminuído de uma maneira geral no País. De 1992 a 2009, o tempo de deslocamento entre os mais pobres subiu 4% e para os mais ricos, a alta foi de 15%.

No entanto, não há de se negar que as cidades ainda têm concentrado os investimentos para os que possuem maior renda. A maior parte das ampliações viárias, a concentração de linhas de metrô e todas as intervenções de infraestrutura ainda são mais evidentes nas regiões centrais que nas periferias.

E quando se fala em desigualdade no tempo de viagem entre os mais ricos e mais pobres, não se pode pensar apenas nas horas que as pessoas passam no trânsito e sim, no que elas poderiam fazer se não estivessem nos congestionamentos. Este aspecto mostra o quanto os investimentos em transportes públicos são essenciais para que as pessoas com menos condições possam ter acesso a novas oportunidades.

Muitos só trabalham e não estudam não porque simplesmente não há escola. Mas porque não sobra tempo para estudar. Muitas famílias cujo pai e cuja mãe têm de trabalhar para o sustento da casa não podem acompanhar adequadamente o crescimento dos filhos pela falta de tempo.

Muita gente deixa de fazer um acompanhamento médico correto não apenas porque não tem vagas nos hospitais, mas porque é difícil chegar às unidades de saúde de referência. O estudo é de Rafael Pereira, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea, em parceria com Tim Schwanen, da Universidade de Oxford, e leva em consideração dados de 10 capitais brasileiras e mais 20 grandes cidades do mundo.

Outra conclusão do levantamento é que as cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro figuram respectivamente na segunda e na terceira posição no ranking de onde as pessoas demoram mais tempo para deslocarem só na ida de casa para o trabalho.

Entre as dez cidades do mundo nas quais as pessoas ficam mais tempo no trânsito estão, de acordo com a pesquisa:

1º) Xangai – 50,4 minutos
2º) São Paulo – 42,76 minutos
3º) Rio de Janeiro – 42,58 minutos
4º) Londres – 37 minutos
5º) Estocolmo – 35 minutos
6º) Recife – 34,88 minutos
7º) Nova Iorque – 34,6 minutos
8º) Tóquio – 34,5 minutos
9º) Salvador – 33,91 minutos
10º) Paris – 33,7 minutos

O estudo não analisa dados de agora, mas da evolução da situação de transportes e deslocamentos destas cidades. Para os municípios brasileiros, o levantamento levou em conta informações coletadas desde 1992 da Pnad – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

E esta evolução de dados mostra resultados bastante interessantes. Em praticamente todas as regiões metropolitanas brasileiras houve aumento do tempo de deslocamento. Mas onde foram realizados investimentos em transportes coletivos, estes aumentos foram contidos e em diversos momentos, houve até redução.

Mas exemplos de cidades como Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba mostram que os investimentos em transportes públicos devem ser constantes. Não basta inaugurar uma obra e pronto. O transporte sempre deve crescer junto com as necessidades da cidade.

De acordo com a pesquisa, em vários anos o percentual de pessoas que demoram mais de uma hora para se deslocarem no Rio de Janeiro caiu fruto de investimentos em obras viárias, no metrô e no sistema de ônibus, mas à medida que estes investimentos diminuíam, voltavam a aumentar o os tempos de deslocamentos.

Diferentemente do que ocorreu em Minas Gerais, São Paulo e na maior parte do Norte e Nordeste, em cidades do Sul do País, em duas décadas o tempo de deslocamento dos cidadãos ficou praticamente estável, mesmo com crescimento populacional. E segundo o estudo que é fruto de uma parceria internacional, o motivo de as viagens não se tornarem mais demoradas foi a atenção maior ao transporte público.

“As exceções a essa tendência (de alta no tempo de deslocamento) são as RMs (Regiões Metropolitanas) de Porto Alegre e Curitiba, que têm apresentado uma tendência praticamente estável ao longo de todo o período. Possivelmente, esta estabilidade se já decorrente de um controle mais bem-sucedido da expansão urbana e de sistemas de transporte público mais eficientes nestas áreas”.

Assim, mostra o estudo, o transporte coletivo não é só um meio de garantir a mobilidade urbana, mas também a justiça social e contribuir para a igualdade de oportunidades.

Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes

Blog Ponto de Ônibus

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