Créditos: Edmar Melo/JC Imagem
Um sistema que, por ser mal implantado, ter premissas técnicas fundamentais ignoradas, ainda é mal entendido e pouco aceito por parte da popolução e da classe política. Mas o sistema Bus Rapid Transit (BRT) significa transporte de qualidade sim senhor. Desde que seja bem feito, siga, sem arrumadinhos ou adequações, regras e padrões operacionais para ter qualidade. Foi assim que esse sistema operado por ônibus ganhou fama a partir de 1974, ao ser criado em Curitiba (PR), e visibilidade mundial em 2000, com a cópia aprimorada da ideia brasileira do Transmilênio, em Bogotá (Colômbia). Na série que o Blog De Olho no Trânsito apresenta neste domingo (6) e segunda-feira (7), o BRT pernambucano, maior legado que o governo estadual deixa após sete anos de gestão Eduardo Campos, será destrinchado. O bom e o ruim, o certo e o errado, expostos.
Começaremos pelos equívocos do BRT pernambucano, batizado Via Livre.
Eles são muitos. Por falta de tempo e, principalmente, cuidado com o
planejamento, o projeto acumula erros. São várias as lacunas, apontadas
por técnicos e futuros operadores, que poderão, caso não sejam
corrigidas a tempo, comprometer sensivelmente a operação e o que mais
importa: a aceitação popular sobre o sistema, previsto para ser a elite
do transporte público da Região Metropolitana do Recife. Por isso, a
necessidade de apontá-las para que, mesmo a 67 dias da Copa do Mundo,
possam ser corrigidas.
O nosso BRT apresenta diversos “puxadinhos”, ou seja, adequações ao projeto original que descaracterizam a proposta de qualidade do sistema, comprometendo sua eficiência. A impressão é que a qualidade do Via Livre limita-se à construção de estações e à compra de ônibus novos (ambos no padrão BRT, extremamente confortáveis). No resto, o governo do Estado está construindo três terminais integrados (Abreu e Lima, III e IV Perimetrais, no Recife) e arrumando os corredores de transporte existentes (PE-15 e Avenida Caxangá).
O nosso BRT apresenta diversos “puxadinhos”, ou seja, adequações ao projeto original que descaracterizam a proposta de qualidade do sistema, comprometendo sua eficiência. A impressão é que a qualidade do Via Livre limita-se à construção de estações e à compra de ônibus novos (ambos no padrão BRT, extremamente confortáveis). No resto, o governo do Estado está construindo três terminais integrados (Abreu e Lima, III e IV Perimetrais, no Recife) e arrumando os corredores de transporte existentes (PE-15 e Avenida Caxangá).
As lacunas são vistas nos dois corredores de BRT projetados pelo
governo: Leste-Oeste, com 15 km entre Camaragibe, Oeste do Grande
Recife, e o Centro do Recife, e o Norte-Sul, que começa em Igarassu,
Norte do Grande Recife, e, num primeiro momento, chega ao Centro,
totalizando 33 km no eixo. Para a produção dessa reportagem, o JC ouviu
operadores, futuros operadores e especialistas do setor. O guia Padrão
de Qualidade BRT, produzido em 2012 pelo Instituto de Políticas de
Transporte e Desenvolvimento (ITDP) e referência no assunto, foi usado
como princípio para apontar erros e acertos. A partir dele, percebe-se
que estamos ferindo premissas básicas do padrão de qualidade do BRT: o
embarque em nível (que não acontecerá na Avenida Conde da Boa Vista, no
Centro do Recife, e em Camaragibe) e a prioridade total nas vias.
Requisitos de qualidade que, junto com o pagamento antecipado da
passagem, deram fama ao BRT a partir de 1974, ao ser criado em Curitiba
(PR), e visibilidade mundial em 2000, com a cópia aprimorada da ideia
brasileira do Transmilênio, em Bogotá (Colômbia).
“Ainda não podemos dizer se o BRT pernambucano estará no padrão Ouro,
Prata ou Bronze no nosso guia porque é preciso que ele entre em
operação de fato. Mas o BRT é chamado de ônibus metronizado por causa
das regras que precisa seguir para ter uma operação tão eficiente quanto
a do metrô, só que bem mais barata. O BRT pernambucano, pelo que vemos,
ainda não ganhou o “R” de rápido. A descaracterização dos projetos,
inaugurados às pressas, têm se tornado prática comum no Brasil por causa
da Copa do Mundo, o que é uma pena. Pernambuco é mais um”, critica
Pedro Torres, gerente de políticas públicas do ITDP Brasil.
O velho e o novo se misturam no BRT pernambucano. Não estamos
construindo corredores novos, implantados de ponta a ponta. No
Norte-Sul, as grotescas e ineficientes paradas de concreto permanecem
porque linhas convencionais vão dividir o espaço. Misturam-se ao
arrojado design das futuras estações de BRT. No Leste-Oeste, o principal
eixo do corredor – a Avenida Caxangá – continua com a aparência de
velha, desarrumada, sem um projeto de requalificação paisagística. O
mesmo acontece na PE-15, Avenidas Pan Nordestina e Cruz Cabugá, eixos do
Norte-Sul.
O tráfego misto em parte dos dois corredores é o que mais preocupa.
Os BRTs tanto vão trafegar misturados a ônibus convencionais, quanto a
veículos particulares. O impacto negativo na velocidade dos ônibus
poderá ser grande, o que preocupa os futuros operadores porque a
cobrança da população virá. Sem prioridade na via, o sistema não será
eficiente. Nenhum é.
Créditos: Edmar Melo/JC Imagem
O metrô, por exemplo, é veloz porque tem caminho próprio e exclusivo. No Norte-Sul, o tráfego misto ocorrerá no Complexo de Salgadinho, onde o volume de veículos é intenso. No Leste-Oeste, as maiores descaracterizações se darão no trecho do município de Camaragibe e na Avenida Conde da Boa Vista, Centro do Recife.
Em Camaragibe, as estações sairão do centro da via para as laterais e
o embarque dos passageiros não será feito em nível, ou seja, na mesma
altura da parada. Os BRTs terão escadas e portas do lado direito (como
os ônibus convencionais). Na Avenida Conde da Boa Vista, que sempre
integrou o Corredor Leste-Oeste, mas cuja solução foi adiada por muitos
anos pelo Estado, o embarque também será desnivelado, com a vantagem que
as paradas estarão dentro de uma faixa exclusiva para ônibus. As
estações da Conde da Boa Vista, mesmo provisórias, não terão
ar-condicionado nem o mesmo nível das estações exigidas no padrão BRT.
A necessidade de ajustes é tanta, que alguns operadores do sistema
chegaram a protocolar alertas no Grande Recife Consórcio de Transporte.
No documento, até erros de desalinhamento dos ônibus para acoplarem nas
estações são citados. A margem de tolerância para a parada do veículo na
estação seria de 70 centímetros, mas da forma como foi executado, foi
reduzida para até três centímetros. Os TIs em construção têm problemas
de circulação para os BRTs e alguns dos terminais antigos que receberão
os BRTs sequer foram adequados. A ausência de estações em trechos,
especialmente do Corredor Norte-Sul, ignora a capacidade de adensamento
urbano do sistema de transporte.
Lamentavelmente, o Estado não quis discutir os erros. Não deu
detalhes da operação. O JC tentou por mais de duas semanas uma
entrevista detalhada com o Grande Recife Consórcio, sem sucesso. As
dúvidas e o atraso que envolvem o BRT pernambucano puderam ser vistos na
semana passada, quando o primeiro veículo e estação foram apresentados.
Tudo no improviso e, agora, com data para entrar em operação completa
apenas em junho.
Blog De Olho no Trânsito
Nenhum comentário:
Postar um comentário