Créditos: Hélia Scheppa/JC Imagem |
Nem só de trilhos e dormentes são feitas as estradas de ferro de Pernambuco. Ao longo dos 1.322,95 quilômetros de linhas, por onde passavam os trens, há túneis esculpidos em montanhas, viadutos de grande altura e pontes de treliça.
As obras de arte – é assim que esses caminhos são chamados pelos
engenheiros – resistem ao tempo no Cabo de Santo Agostinho, Gravatá,
Maraial, Quipapá, Bezerros, Pesqueira, Paudalho, Nazaré da Mata,
Timbaúba e Recife, entre outras cidades.
Só na Serra das Russas, em Gravatá, município do Agreste do Estado,
foram construídos 14 túneis. Era a única solução para o trem cruzar
regiões montanhosas, porque ferrovias não sobem e descem colinas, como
as rodovias.
Na verdade, a linha teria 21 passagens subterrâneas, mas desfizeram
sete por razões técnicas, conta o estudante de história André Cardoso.
Representante local da ONG Amigos do Trem, ele acompanhou o JC na visita
a duas delas, no Cabo e em Gravatá.
O acesso ao túnel número 1 da Serra das Russas, concluído em 1887, só
foi possível com a ajuda do agricultor José João dos Santos, 58 anos,
morador da área. “Tem muito mato no caminho, eu vou com vocês”, disse, sem pestanejar.
“Quando o trem rodava era mais fácil chegar aos túneis. Agora, o mato
toma conta de tudo”, comenta José João, cortando os galhos com um facão.
Com 94,45 metros de extensão, sem revestimento nas paredes e no teto,
o túnel curvilíneo está inteiro e preserva os trilhos. Os marimbondos,
que aterrorizavam o motorista Jovenildo Leite, 37, em suas viagens ao
Sertão, na meninice, ainda se refugiam no local.
“É só passar quieto, não falem e não toquem neles”, ensina o
agricultor à equipe de reportagem. A técnica funcionou. Com Jovenildo, a
história foi diferente. “O trem fazia barulho e ficava tudo escuro
porque não tinha energia no túnel. Os marimbondos entravam nos vagões e
era um inferno”, recorda.
O trecho de 76 quilômetros de extensão da Linha Centro (Estrada de
Ferro Recife-Gravatá), onde encontram-se os caminhos subterrâneos da
Serra das Russas, é tombado como patrimônio de Pernambuco desde 1986,
pelo valor das obras de arte, diz a arquiteta Neide Fernandes, da
Diretoria de Preservação Cultural da Fundarpe.
Mais acessível aos visitantes, mesmo com mato e boiada em cima da
linha, o Túnel do Pavão, no Cabo de Santo Agostinho, município do Grande
Recife, foi o primeiro a ser construído no País para atender as
ferrovias, no fim da década de 1850.
Fresquinho e revestido, tem 151,78 metros e extensão e fica entre as
localidades de Mercês e Charneca. Oito cavernas de proteção, escavadas
nas paredes, servem de abrigo para o pedestre, se por acaso a pessoa
estiver no local e for surpreendida com a chegada de um trem.
André Cardoso, pesquisador das ferrovias do Estado, informa que o
Túnel do Pavão faz parte da Linha Sul, originária da primeira estrada de
ferro de Pernambuco e segunda do Brasil. “A importância histórica não é
só local, mas nacional. Alguns foram abertos na picareta”, destaca.
As obras de arte da malha ferroviária pernambucana também foram
inventariadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional. A finalidade do levantamento é atribuir (ou não) valor
cultural à herança do trem, explica o engenheiro Frederico Almeida,
superintendente do Iphan.
“Túneis, pontes e viadutos da Serra das Russas poderiam funcionar com
trens turísticos”, afirma o engenheiro. “Assim como em Gravatá, o
turismo e o transporte público de passageiros também são bem-vindos na
linha Recife-Nazaré da Mata, com o aproveitamento das estações”,
acrescenta.
JC Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário