As
estimativas são positivas. De acordo com o presidente da FABUS e
vice-presidente da Fiesp, em entrevista exclusiva ao Canal do Ônibus /
Blog Ponto de Ônibus, José Antônio Fernandes Martins, indústria nacional
já começa com uma carteira de 12 mil ônibus
Créditos: Guto de Castro/Acervo
A
indústria brasileira de ônibus pode bater mais um recorde histórico em
2013, superando o bom desempenho de 2011, quando foram feitos mais de 31
mil veículos de transportes coletivos. E
a melhor notícia para os fabricantes é que boa parte desses ônibus já
está encomendada. O ano começa com uma carteira de encomendas de mais de
12 mil veículos.
Boa parte destes números positivos para a produção de ônibus será resultado de investimentos públicos diretos. Quem
revela é José Antônio Fernandes Martins, presidente da FABUS –
Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus, que reúne as
encarroçadoras, vice-presidente da Fiesp – Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo, vice-presidente da Fiergs – Federação das
Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul, executivo da fábrica de
carrocerias Marcopolo e um dos fundadores da Volare, e membro do
Conselho Superior de Comércio Exterior da Fiesp e do IEDI – Instituto de
Estudos para o Desenvolvimento Industrial.
Martins
atendeu ao Canal do Ônibus e Blog Ponto de Ônibus com exclusividade
nesta quarta-feira, dia 06 de março de 2013, na sede da Fiesp, na
Avenida Paulista, em São Paulo. Os
números positivos referentes às licitações vão trazer um impacto maior
paras as fabricantes, já que as compras púbicas se dão de maneira
direta. Revendedores, concessionárias e representantes se beneficiam
mais pela venda aos frotistas e autônomos, que também deve crescer.
Muitas
regiões e sistemas precisam de modernização dos veículos. Como exemplo,
Martins citou algumas regiões que necessitam de renovação de frota,
como os ônibus intermunicipais do ABC Paulista, cujas idades chegam a 15
anos de uso, e os ônibus de linhas interestaduais e internacionais que
possuem idade média de 9,8 anos. A licitação da ANTT – Agência Nacional
de Transportes Terrestres, que deveria estar mais avançada, prevê idade
máxima de 10 anos de uso e média de 5 anos.
Martins
reconhece que a maior ação do Governo Federal em prol da mobilidade
urbana tem influência de eventos como Copa do Mundo e Olimpíadas de
2016, mas não acredita que depois destes eventos, os investimentos no
setor caiam, isso pela exigência da população e pelos ganhos de
competitividade que a mobilidade urbana traz para todo o País, inclusive
para o setor industrial.
“Está
se criando uma cultura de investimentos, uma cultura da mobilidade, a
cultura de se poder viver num centro urbano de maneira civilizada. Hoje
pessoas em São Paulo perdem quatro horas por dia em deslocamentos, as
pessoas perdem um mês por ano viajando. Isso é uma desumanidade e o povo
não vai agüentar mais”
O
executivo diz que hoje não só as cidades e as pessoas, mas a indústria
sofre muito pela falta de transporte coletivo adequado. São funcionários
que não rendem porque já chegam cansados ao serviço, atrasados, e
também o trânsito dificulta o escoamento de cargas. Com mais ônibus nas
ruas e menos carros de passeio, será possível aproveitar melhor o espaço
urbano e aumentar a velocidade comercial também dos veículos de carga.
Segundo
Martins, a Mobilidade Urbana é ponto decisivo na competitividade
mundial de qualquer indústria. Uma cidade com trânsito difícil significa
mais custo de transportes, que por sua vez influencia no preço final
dos produtos e no seu poder de concorrência no mercado internacional.
José
Antônio Fernandes Martins concorda com projeção feita pelo presidente
da Empresa de Planejamento e Logística, Bernardo Figueiredo, de que a
infraestrutura no Brasil precisa entre R$ 500 bilhões e R$ 600 bilhões
de investimentos até 2016.
Quanto
a uma possível invasão de ônibus chineses no Brasil, a indústria
brasileira diz que está preparada pela qualidade de seus produtos. Mas
se mesmo assim, a presença de ônibus asiáticos ameaçar a concorrência
dos veículos nacionais, há táticas comerciais, como a indústria
brasileira importar os ônibus que ela mesmo produz na Ásia.
“E
além de tudo nós temos estratégias de proteção. Nós da Marcopolo, por
exemplo, temos uma fábrica grande na Índia, em parceria com a Tata, onde
produzimos 15 mil ônibus, temos também uma fábrica na China e que se
houver uma penetração de chineses exagerada em nosso território por
cobrarem preços mais baixos, vamos mandar para cá os ônibus que
produzimos lá que é o mesmo preço que dos ônibus deles. Vamos importar
os ônibus indianos e chineses das nossas fábricas, mas vamos mante4r o
nosso mercado aqui sem sermos destruídos pelos chineses.”
Segue a íntegra da entrevista:
Adamo
Bazani: Quais são as perspectivas para a indústria brasileira de ônibus
para o ano de 2013, tanto em relação aos negócios como na questão de
mobilidade urbana?
José Antônio Fernandes Martins:
Antes é necessário deixar claro o seguinte aspecto. Muito se fala em
mobilidade no Brasil e as razões pelas quais ela se deteriorou. A última
planilha do Ministério das Cidades mostra que hoje nós temos um número
impressionante de 73 milhões e 700 mil veículos entre carros, caminhões,
comerciais leves, ônibus, motos, etc. Este número do Ministério das
Cidades é de julho de 2012. Dez anos atrás, em 2002, este número era
exatamente de 35 milhões de veículos. De 35 milhões para mais de 73
milhões significa que houve um acréscimo de 110% de número de veículos
que entraram em nossa infraestrutura. E aí nós perguntamos. Nestes 10
anos, se os veículos subiram 110% em quantidade, quanto que nossa
infraestrutura melhorou? Eu arriscaria dizer que não mais de 10%. Esse
descompasso fez com que os congestionamentos aumentassem, aumentasse o
número de acidentes, aumentasse a contaminação ambiental. Toda essa
falta de mobilidade faz com que o país ande devagar, prejudique a nossa
competitividade, liquide com nossa produtividade e faz com que as
indústrias acabem sofrendo impactos muito violentos na sua produção. A
nossa indústria de transformação ela encolheu 2,7% no ano de 2012,
principalmente prejudicada pela “invasão” dos produtos chineses.
No
ano de 2011, o déficit entre importação e exportação estava em torno de
US$ 92 bilhões, que nós compramos mais que vendemos. Este ano, de
acordo com a FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo),
nós devemos chegar a US$ 105 bilhões de importações acima das
exportações. São números que mostram os empregos que nós geramos lá
fora.
Essa
falta de mobilidade que retira nossa competitividade tem de ser
solucionada pelo Governo. O Governo então vendo que isso tudo estava
esmagando o nosso PIB, que no ano passado foi ridículo, de 0,9%, lançou
vários planos para evitar perdas maiores. Lançou o Plano Brasil Maior,
no qual está incluída a desoneração da folha de pagamento para 41
setores da economia, dos quais o último foi o setor de construção civil,
onde também estamos nós fabricantes de ônibus e trens e onde estão as
empresas operadoras de transporte coletivo. Esse plano vai possibilitar
uma situação melhor para o segmento de transportes. Depois surgiu o PSI 4
– Programa de sustentação do Investimento, do Finame, reduzindo os
juros que eram de 10%, para 7,5%, depois baixou para 5,5% e de 5,5% para
2,5% no ano passado. Juros de 2,5% até dezembro do ano passado eram
juros negativos se for levar em conta que nossa inflação quase chegou a
6%, nós temos um “juro negativo” em torno de 3,5%. Este ano aumentou um
pouquinho, passou de 2,5% para 3 %, mas ainda é uma taxa de juro
altamente confortável. O Governo Federal ainda colocou vários incentivos
de financiamento para a exportação, tanto que para o setor ônibus, esta
exportação já deu sinais extraordinários de melhora já no ano passado,
aumentando a exportação de 2011 para 2012 para 5,2%.
Além
disso, foi criado ainda o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento –
Mobilidade de R$ 32,8 bilhões, pelo qual o Governo está investindo em
infraestrutura viária urbana, como corredores de ônibus, vias
segregadas, plataformas de embarque, sistema de sinalização, tudo isso
num sentido de fazer com que o trânsito na cidade adquira uma maior
velocidade comercial. Hoje nós aqui em São Paulo, quando tudo vai bem, a
média de velocidade é de 9 quilômetros por hora. Se você caminhar
ligeiro, caminha mais rápido que o trânsito. Numa via segregada para
ônibus como tem na Colômbia (Transmilênio, de Bogotá), como tem em
Curitiba, a velocidade comercial em média pode chegar a 25 km/h, 28 km/h
até 30 km/h. Nesta velocidade comercial, é possível criar uma
atratividade para as pessoas deixarem o carro em casa em andar de
ônibus, trocar o transporte individual pelo transporte público, pois as
pessoas querem chegar rapidamente ao destino, não importa como. Então,
esse PAC Mobilidade está investindo na infraestrutura viária, no sistema
de metrôs, no sistema de VLT – Veículo Leve Sobre Trilhos, no BRT – Bus
Rapid Transit , que vai casar a oferta de ônibus modernos e maiores
pela indústria com a infraestrutura necessária para estes veículos
rodarem. Depois do PAC da Mobilidade, foi lançado em fins de junho pela
presidenta Dilma Rousseff, o PAC Equipamentos, onde foi estabelecida
compra de 8 mil 570 ônibus escolares, todos financiados pelo FNDE –
Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação. Só o PAC Equipamentos
faria com que o mercado de ônibus de 2012 fechasse tão bem quanto o
mercado de 2011 que foi um recorde. Só que como esse PAC Equipamentos
foi publicado no final de junho, e começou a operar em meados de julho,
as montadoras e as encarroçadoras de ônibus, não tiveram condições de
montar os 8 mil 570 ônibus. Foram feitos no ano passado cerca de 4 mil
500 ônibus escolares e ficou o restante de quase 4 mil ônibus que não
puderam ser produzidos. E por isso, pela falta desses quase quatro mil, o
nosso mercado interno fechou 2012 com déficit de produção de 10% em
média. Chegou a 28 mil 600 ônibus. Se tivéssemos colocado mais 3 mil 500
ou 4 mil ônibus, que não foram produzidos mas foram encomendados pelo
PAC Equipamentos, nós faríamos em 2012 uma produção maior que o recorde
de 2011., mesmo com todas as dificuldades de 2012, como a adaptação do
empresariado para a tecnologia de redução de poluição Euro V e o fraco
desempenho da economia nacional.
Esta
quantidade que não foi produzida agora será contabilizada para 2013. E
ainda no final, em novembro de 2012, a presidenta da República através
do FNDE lançou mais uma licitação de 8 mil ônibus para o Programa
Caminho da Escola Rural que serão entregues para este ano de 2013. Em
2013, já iniciamos com uma carteira de 4 mil que sobrou do ano anterior
mais 8 mil do Caminho da Escola Rural, como resultado são 12 mil ônibus,
além de 800 ônibus para transporte de pessoas com necessidades
especiais. Num mercado de 31 mil ônibus, já temos aí um caminho bom pela
frente. Nós esperamos que 2013, com a manutenção do PSI 4 (Programa de
Sustentação do Investimento), com a existência da desoneração das
fabricantes e das empresas operadoras (cujo impacto deve ser muito
grande pela quantidade de pessoas que empregam), tudo isso vai favorecer
para que as empresas partam para comprar mais ônibus.
AB: E muitas cidades precisam dessa renovação e não precisa ir
longe da capital para encontrar frotas velhas, como dos ônibus
intermunicipais do ABC Paulista.
JAFM: Tem ônibus nessa região com idades entre 12 e
15 anos. E não é só o segmento de urbanos. Se formos ver os ônibus
interestaduais e internacionais, a idade da frota é de 9,8 anos de
idade. As ações governamentais e da indústria estão sendo feitas de uma
maneira que a gente possa melhorar todo esse sistema. O Governo criou
agora, paralelamente a isso, o PAC Ferrovias e Rodovias, com 10 mil
quilômetros de ferrovia e 7,5 mil quilômetros de rodovia, nessas
rodovias fala-se na duplicação e concessão de novos modais, o que vai
fazer com que as rodovias fiquem melhores, mais bem pavimentadas, vão
dar mais velocidade comercial e com isso, haverá benefício no transporte
coletivo também.
Este
PAC Ferrovias e Rodovias que vai começar a partir do final deste ano,
com mais as outras ações em andamento e o custo menor da energia
elétrica vai reduzir o nosso custo geral e fortalecer nosso poder de
competição. As alterações no câmbio também nos dão mais margem de
competitividade.
Com
menos custos, nossos clientes, os operadores de ônibus urbanos e
rodoviários, também terão condições de comprar mais. O valor da
desoneração vai poder ser empregado na compra e na remodelação da frota,
que era uma coisa que eles precisavam, mas não esperavam.
AB: O que percebemos é que nunca o Governo Federal se envolveu
tanto na questão da mobilidade urbana, setor há muito tempo esquecido
por esta esfera de poder, cuja responsabilidade caía somente sobre as
costas dos Estados e municípios. Claro que parte desse envolvimento se
deu depois que o Brasil foi anunciado como sede de eventos
internacionais que exigem modernização nas cidades, como a Copa do Mundo
de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Há o risco de depois de estes eventos
passarem, a situação se reverter e diminuir novamente o compromisso do
Governo Federal com a mobilidade urbana?
JAFM: Acho que existe uma lei básica no mundo dos
negócios de que o desenvolvimento chama desenvolvimento e retração chama
retração. Na medida que nós criarmos uma infraestrutura para termos
melhor mobilidade, o povo não vai aceitar uma redução dessa mobilidade e
o governo não vai suportar com que a competitividade do sistema diminua
porque se parou de investir. Os investimentos em mobilidade começam e
não têm como parar. É uma escada que se vai subindo e não tem como
descer. Se descer, destrói com todo o sistema urbano, com todo o sistema
rodoviário. Eu vejo que todos estes investimentos que o Governo tá
fazendo são apenas um princípio. O próprio presidente da EPL – Empresa
de Planejamento e Logística, Bernardo Figueiredo, disse que as
necessidades de investimentos em infraestrutura no Brasil hoje até 2016
seriam entre R$ 500 bilhões e R$ 600 bilhões. Acredito que o Governo vai
investir nisso, o Governo vai perseguir estes números. Está se criando
uma cultura de investimentos, uma cultura da mobilidade, a cultura de se
poder viver num centro urbano de maneira civilizada. Hoje pessoas em
São Paulo perdem quatro horas por dia em deslocamentos, a pessoa perde
um mês por ano viajando. Isso é uma desumanidade e o povo não vai
agüentar mais. Com estes investimentos, o Governo vai aumentar as
velocidades comerciais, diminuir os congestionamentos, reduzir os
acidentes, vai reduzir substancialmente a contaminação ambiental, o modo
de vida vai melhorar em termos de saúde, stress e satisfação da
população.
AB – A Mobilidade exige a participação de diversos agentes, como
governos em diversas esferas, as empresas transportadoras e até a
própria população. E a indústria de ônibus, pode ajudar em que nessa
questão de mobilidade urbana?
JAFM: A indústria brasileira de transporte por
ônibus está preparada, não é de agora, temos anos e anos de luta e
experiência que iniciamos no sentido de melhorar a qualidade, a
performance, o conforto, resistência e até o design. Nosso produto
ônibus é um dos melhores do mundo. Não ficamos devendo nada aos produtos
europeus. Quando eu comecei a trabalhar com ônibus, há 47 anos, a gente
se extasiava com o design e a qualidade dos ônibus da Alemanha, da
Holanda, da Bélgica, na França. Hoje não mais. Hoje tem muita gente
olhando os nossos produtos que têm qualidade e são feitos dentro de
normas de redução de emissão de poluentes, segurança, durabilidade e
conforto. Nossos ônibus estão enquadrados entre as melhores normas
mundiais.
AB : Sabemos entretanto, que apesar de investimentos do Governo
Federal e dos locais, ainda o Brasil convive com a realidade de estradas
de terra, ruas esburacadas e pavimentação inadequada até mesmo em
grandes cidades. Por conta disso, a indústria brasileira ainda tem de
fazer produtos robustos, como ônibus de motor dianteiro. Como oferecer o
maior conforto possível aos passageiros e motoristas nestes veículos
mais rústicos?
JAFM: O veículo robusto não tem nada a ver com
conforto que é interno. Claro que o veículo robusto fica prejudicado no
design, mas hoje em termos de conforto, segurança, itens como ar
condicionado, ele funciona perfeitamente. Não podemos nos fixar apenas
nos produtos de luxo. Sabemos que o Brasil é um país enorme. No Norte e
Nordeste ainda temos muitas estradas de terra e nossos ônibus têm
condições de prestar serviços nestes locais. Essa flexibilidade é que
chama atenção no mercado internacional. A Europa não consegue fazer como
nós veículos confortáveis e robustos ao mesmo tempo. Europeu não sabe o
que é buraco. Nós produzimos um veículo que agüenta chuvas e trovoadas.
Nosso ônibus é um veículo excelente para estradas ruins e estradas
boas.
AB: A indústria de ônibus brasileira se prepara para uma eventual entrada de ônibus chineses no País?
JAFM: Nós estamos preparados hoje para atender ao
mercado brasileiro dentro das nossas necessidades, sabendo como os
chineses atuam. Os chineses têm preços muito mais baixos do que os
nossos, mas em termos de qualidade, resistência e performance, os nossos
ônibus são muito melhores. E além de tudo nós temos estratégias de
proteção. Nós da Marcopolo temos uma fábrica grande na Índia, em
parceria com a Tata, onde produzimos 15 mil ônibus, temos também uma
fábrica na China e que se houver uma penetração de chineses exagerada em
nosso território por cobrarem preços mais baixos, vamos mandar para cá
os ônibus que produzimos lá que é o mesmo preço que dos ônibus deles.
Vamos importar os ônibus indianos e chineses das nossas fábricas, mas
vamos mante4r o nosso mercado aqui sem sermos destruídos pelos chineses.
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes.
Canal do Ônibus
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