Créditos: Blog do Fabio Cavalcante/Acervo
As metrópoles se expandiram demais, motivadas pela velocidade do
transporte rodoviário, principalmente o carro. O resultado é que, sem
mobilidade, as distâncias tornaram-se maiores. A solução é deixar de
expandir para crescer para dentro.
As metrópoles devem crescer para dentro, reestruturando o que existe,
no lugar de se expandir. É o mais inteligente. É o mais sustentável. A
imobilidade, alimentada pela opção pelo transporte rodoviário,
principalmente o automóvel, exige essa mudança de estratégia de
desenvolvimento. As cidades cresceram demais sem a infraestrutura devida
e de costas para o transporte de massa (metrô e trem), obrigando os
trabalhadores a percorrerem cada vez distâncias maiores no percurso
casa-trabalho. Para reduzir o tempo de deslocamento, a Confederação
Nacional da Indústria (CNI), que realizou estudo sobre o impacto da
imobilidade na produção brasileira das 12 maiores metrópoles
brasileiras, alerta que o Brasil precisa parar de seguir o modelo
americano de crescimento e adotar um estilo mais europeu de viver. Ou
seja, trabalhar e estudar perto do trabalho ou trabalhar próximo à
residência e à escola. Simples assim.
A Região Metropolitana do Recife fez e faz exatamente o contrário.
Estimula cada vez mais longos percursos. Os dois ramais do metrô
existentes na cidade, que compreendem 25 quilômetros de extensão e
transportam diariamente 280 mil passageiros, são cercados de moradias
simples, muitas vezes invasões. O entorno das duas linhas, especialmente
a Linha Centro, é tão desvalorizado que a ocupação é totalmente
desordenada. Na Linha Sul do metrô, que liga o Centro do Recife ao
extremo do município de Jaboatão dos Guararapes pela Zona Sul da
capital, a situação é um pouco melhor devido à proximidade com a orla
marítima. Mas, mesmo assim, o adensamento imobiliário de qualidade é
verificado basicamente na altura do bairro de Boa Viagem. Em alguns
pontos, as invasões chegam ao muro de proteção da linha metroviária.
Créditos: Pernambuco Construtora/Acervo
Quem vive perto do metrô sente na pele a baixa valorização do
entorno. Os números do próprio sistema revelam esse fracasso. Dos 280
mil passageiros transportados diariamente, apenas 30% são lindeiros, ou
seja, entram diretamente no sistema metroviário pelas estações. O
restante, 70%, é lançado pelos ônibus, através do Sistema Estrutural
Integrado (SEI). Ou seja, são pessoas que vem de longe, não residem
perto do metrô. Na prática, essa ausência de passageiros lindeiros
comprova que as cidades cortadas pelo sistema metroviário (Recife,
Jaboatão dos Guararapes e Camaragibe) se desenvolvem ignorando o
potencial do metrô.

Nos corredores de ônibus acontece o mesmo. A PE-15, o mais extenso
e qualificado corredor de transporte público da RMR, tem o entorno
bastante degradado, com submoradias nas suas margens. Em seu estudo, a
CNI indica que a preferência pelo transporte rodoviário criou as cidades
informais dos loteamentos e favelas - pessoas que preferem morar perto
do trabalho, mesmo em submoradias, a enfrentar a angústia do
deslocamento. “A força do transporte rodoviário, seja coletivo ou
individual, liberou o urbanismo da obrigação da densidade e da
continuidade. Ou seja, se formaram núcleos urbanos isolados nas
periferias, com desperdício de espaço e altos custos sociais. A cidade
ficou esgarçada”, argumenta o diretor de políticas e estratégia da CNI,
José Augusto Fernandes.
Esse “esgarçamento” é um problema porque, quanto maior a cidade,
maiores as necessidades de transporte. E, como são as cidades grandes
que respondem por quase metade do PIB, elas não podem parar. “As
metrópoles são o lugar do intercâmbio econômico mundial. Estamos pagando
um preço alto por optar pelo transporte rodoviário, com estímulo
sobretudo ao carro, sem ter investido no transporte de alto rendimento.
Falta oferta de serviços e as pessoas têm que se deslocar. Houve uma
expansão exagerada e a infraestrutura não acompanhou. O Brasil precisa
rever essa lógica”, acrescenta Fernandes.
Relação com a moradia
No estudo, a CNI revela, ainda, que os ganhos econômicos da
metropolização são maiores do que a descentralização urbana. E que é
preciso parar de investir em um único tipo de transporte. É urgente
integrar, criar uma rede multimodal para atender aos deslocamentos
casa-trabalho, que representam mais da metade das viagens urbanas do
Brasil. “Habitação e transporte público desenham majoritariamente as
cidades brasileiras. Temos limitação de transporte e um déficit
habitacional gigantesco. 20% das moradias do Brasil foram construídas
pela própria população, sem crédito, o que contribuiu para a criação de
favelas. Famílias constroem em periferias cada vez mais distantes e
menos densas, sem infraestrutura e oferta de serviços. 88% dos
domicílios irregulares estão nas regiões metropolitanas. É preciso sanar
esse déficit”, alerta a CNI.
ABANDONO
Silvana Nunes e Edson Andrade, 45, mudaram-se para o Barro, às
margens da Linha Centro do metrô, na Zona Oeste do Recife, para fugir da
violência e ter um bom transporte. Não alcançaram o primeiro objetivo e
chegaram ao segundo apenas parcialmente. Usam o sistema metroviário
porque são teimosos e minimizam o abandono que os cerca. Mas não
conseguiram se livrar da violência. O fato de estarem ao lado do metrô
não lhes dá nenhuma garantia. Ir e voltar da estação mais próxima,
distante pouco mais de um quilômetro, é um desafio diário. “Adoramos o
metrô, mas o entorno da linha deveria, de fato, ser mais cuidado e
valorizado. A verdade é que ninguém liga, nem dá valor”, afirmam.
ACESSO RUIM
Israel Neto, 57, funcionário público, vê o metrô da janela do
apartamento, mas raramente utiliza o sistema. O percurso entre o
condomínio em que vive até a estação mais próxima, Barro, é sujo,
perigoso e totalmente acidentado. “Estou tão perto, mas ao mesmo tempo
tão longe. É um risco caminhar até a estação. Tudo é sujo, quebrado e
abandonado. Por isso a maioria dos moradores do condomínio onde resido
simplesmente ignora o metrô, embora estejamos ao lado da Linha Centro.
Quando decidi morar aqui, o sistema me atraiu, mas com o tempo fui vendo
que era desestimulante usá-lo. Quando decido fazer uso, sei que estou
correndo riscos”, diz.
Jornal do Commercio
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